“Justiça social também é vida devocional”: o lugar da justiça social na espiritualidade cristã.
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por Pedro Grabois*
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Existe uma forte tendência do ser humano em querer separar matéria e espírito. Desta percepção fragmentada da vida surge uma outra separação: a que é feita entre justiça e espiritualidade. São muito comuns os discursos religiosos, no meio cristão, que tratam da espiritualidade como algo que diz respeito apenas ao indivíduo, ao seu interior, à sua subjetividade. Estes tratam freqüentemente da espiritualidade, da fé e da própria verdade do Evangelho de Jesus Cristo como algo abstrato, etéreo, flutuante, pairando sobre a terra. Mas a fé é algo concreto, fincado no chão, que se relaciona diretamente com os contextos e os problemas que nos envolvem.
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Existe uma forte tendência do ser humano em querer separar matéria e espírito. Desta percepção fragmentada da vida surge uma outra separação: a que é feita entre justiça e espiritualidade. São muito comuns os discursos religiosos, no meio cristão, que tratam da espiritualidade como algo que diz respeito apenas ao indivíduo, ao seu interior, à sua subjetividade. Estes tratam freqüentemente da espiritualidade, da fé e da própria verdade do Evangelho de Jesus Cristo como algo abstrato, etéreo, flutuante, pairando sobre a terra. Mas a fé é algo concreto, fincado no chão, que se relaciona diretamente com os contextos e os problemas que nos envolvem.
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Temos que nos perguntar então o que significa dizer que justiça social também seja vida devocional. Em primeiro lugar, não significa reduzir a vida devocional, a vida de fé, a espiritualidade genuinamente evangélica[1] a meras práticas sociais. Declarar que justiça social também seja vida devocional é compreender que a prática e a busca da justiça são partes integrantes essenciais à fé cristã (Miquéias 6: 8; Mateus 5: 6 e 6: 33). Quando pretendemos ser seguidores de Cristo sem levar em conta a dimensão da justiça, estamos vivendo um evangelho capenga, mutilado. Esta mensagem parcial, partida, incompleta, não é de modo algum o Evangelho de Jesus.
Temos que nos perguntar então o que significa dizer que justiça social também seja vida devocional. Em primeiro lugar, não significa reduzir a vida devocional, a vida de fé, a espiritualidade genuinamente evangélica[1] a meras práticas sociais. Declarar que justiça social também seja vida devocional é compreender que a prática e a busca da justiça são partes integrantes essenciais à fé cristã (Miquéias 6: 8; Mateus 5: 6 e 6: 33). Quando pretendemos ser seguidores de Cristo sem levar em conta a dimensão da justiça, estamos vivendo um evangelho capenga, mutilado. Esta mensagem parcial, partida, incompleta, não é de modo algum o Evangelho de Jesus.
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Para vivermos a Boa-Nova de Jesus de maneira integral precisamos levar em consideração toda a sua vida aqui na Terra: seu nascimento, as obras que realizou em seu ministério, as parábolas que contou, o resgate da Lei que realizou a partir do amor e da defesa da vida, o jeito como olhou e cuidou do ser humano, sua morte e ressurreição. A verdade do Evangelho é a verdade de um Deus que se fez carne, de alguém que desce de uma condição espiritual, considerada elevada, para a material, até então considerada inferior. A ascese cristã não deve ser do tipo que prega que o corpo é mau e que dele devemos nos desprender para chegar à dimensão espiritual. Cristo veio em carne e anunciou a chegada do Reino de Deus aqui na Terra. A realidade espiritual do humano existe na realidade material.
Para vivermos a Boa-Nova de Jesus de maneira integral precisamos levar em consideração toda a sua vida aqui na Terra: seu nascimento, as obras que realizou em seu ministério, as parábolas que contou, o resgate da Lei que realizou a partir do amor e da defesa da vida, o jeito como olhou e cuidou do ser humano, sua morte e ressurreição. A verdade do Evangelho é a verdade de um Deus que se fez carne, de alguém que desce de uma condição espiritual, considerada elevada, para a material, até então considerada inferior. A ascese cristã não deve ser do tipo que prega que o corpo é mau e que dele devemos nos desprender para chegar à dimensão espiritual. Cristo veio em carne e anunciou a chegada do Reino de Deus aqui na Terra. A realidade espiritual do humano existe na realidade material.
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Muito da tendência do não envolvimento com a busca e a prática da justiça está ligada a esse ascetismo, uma pretensão de espiritualidade separada da matéria. Fala-se de disciplinas espirituais e de práticas devocionais fazendo referência apenas a oração, leituras bíblicas, jejum, cultos coletivos, etc. Não que estes elementos não sejam importantes, mas a vida espiritual não se resume a isto. Justiça social também é parte da vida e, portanto, também integra a vida devocional, mas também não deve ser encarada como se fosse somente mais uma disciplina espiritual, um apêndice da vida.
Muito da tendência do não envolvimento com a busca e a prática da justiça está ligada a esse ascetismo, uma pretensão de espiritualidade separada da matéria. Fala-se de disciplinas espirituais e de práticas devocionais fazendo referência apenas a oração, leituras bíblicas, jejum, cultos coletivos, etc. Não que estes elementos não sejam importantes, mas a vida espiritual não se resume a isto. Justiça social também é parte da vida e, portanto, também integra a vida devocional, mas também não deve ser encarada como se fosse somente mais uma disciplina espiritual, um apêndice da vida.
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Contudo, não devemos procurar um trabalho social para estar bem com Deus, ou para ter a consciência aliviada, ou para sentir que estamos fazendo a nossa parte. Não, não é nada disto. E infelizmente isto também é muito comum: pessoas se envolvendo com os problemas dos outros, pensando que assim estão resolvendo seus próprios problemas. Esta última atitude é apenas um reflexo do individualismo ensinado pelo sistema em que vivemos. Não é isto que deve orientar quem segue a Cristo na busca e na prática da justiça. O que o Evangelho traz é a perspectiva de uma vida de missão à luz do Reino de Deus. Reino de Deus implica diretamente em viver os princípios trazidos e resgatados por Cristo, de modo prático, com ações concretas. O amor pregado por Jesus é sobretudo um amor prático, que está ligado a um fazer, ligado a usar de misericórdia para com o próximo (Lucas 10: 37).
Contudo, não devemos procurar um trabalho social para estar bem com Deus, ou para ter a consciência aliviada, ou para sentir que estamos fazendo a nossa parte. Não, não é nada disto. E infelizmente isto também é muito comum: pessoas se envolvendo com os problemas dos outros, pensando que assim estão resolvendo seus próprios problemas. Esta última atitude é apenas um reflexo do individualismo ensinado pelo sistema em que vivemos. Não é isto que deve orientar quem segue a Cristo na busca e na prática da justiça. O que o Evangelho traz é a perspectiva de uma vida de missão à luz do Reino de Deus. Reino de Deus implica diretamente em viver os princípios trazidos e resgatados por Cristo, de modo prático, com ações concretas. O amor pregado por Jesus é sobretudo um amor prático, que está ligado a um fazer, ligado a usar de misericórdia para com o próximo (Lucas 10: 37).
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Que nosso servir a Deus aconteça através do nosso serviço ao próximo. Que o amor que dedicamos a Deus seja manifesto concretamente no nosso amor ao próximo. Mas podemos nos perguntar: quem de fato é nosso próximo? Podemos também nos perguntar: como agir, como fazer justiça, como clamar por justiça de um modo que transforme as vidas das pessoas de uma maneira efetiva? Quando nos lançamos sobre a busca e a prática da justiça, logo percebemos que há mais perguntas e dúvidas do que certezas e respostas-prontas. Aliás, devemos fugir das repostas-prontas. Neste terreno, elas são uma armadilha terrível.
Que nosso servir a Deus aconteça através do nosso serviço ao próximo. Que o amor que dedicamos a Deus seja manifesto concretamente no nosso amor ao próximo. Mas podemos nos perguntar: quem de fato é nosso próximo? Podemos também nos perguntar: como agir, como fazer justiça, como clamar por justiça de um modo que transforme as vidas das pessoas de uma maneira efetiva? Quando nos lançamos sobre a busca e a prática da justiça, logo percebemos que há mais perguntas e dúvidas do que certezas e respostas-prontas. Aliás, devemos fugir das repostas-prontas. Neste terreno, elas são uma armadilha terrível.
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Fiquemos então com a certeza de que o Evangelho nos traz uma mensagem de comprometimento com o Reino de Deus e sua justiça e de que é preciso esforço e dedicação para viver neste caminho. É preciso preparar-se, capacitar-se, conhecer as realidades diferentes da nossa, deixar de lado um monte de preconceitos, etc.
Fiquemos então com a certeza de que o Evangelho nos traz uma mensagem de comprometimento com o Reino de Deus e sua justiça e de que é preciso esforço e dedicação para viver neste caminho. É preciso preparar-se, capacitar-se, conhecer as realidades diferentes da nossa, deixar de lado um monte de preconceitos, etc.
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É o voluntariado que vai solucionar todos os problemas? É a educação? É a ação da polícia? É a realização da reforma agrária? É a micro-política? É a visitação? É a alfabetização? Uma ação individual isolada muda uma realidade? Restam muitas perguntas sem resposta-pronta, e para resolver ou dissolver estes problemas é preciso lançar-se sobre este caminho, de prática e busca da justiça, que mistura uma série de elementos. Está claro que não é apenas um tipo de ação que dará conta dos problemas à nossa volta. A missão é integral, e deve ser pensada e realizada deste modo. Fica para nós o princípio vivo do Evangelho de Jesus que pede que dirijamos nossa atenção para a Natureza e os oprimidos da Terra. O cuidado é o novo-velho paradigma do cristianismo. Por isso afirmamos que justiça social também é vida devocional.
É o voluntariado que vai solucionar todos os problemas? É a educação? É a ação da polícia? É a realização da reforma agrária? É a micro-política? É a visitação? É a alfabetização? Uma ação individual isolada muda uma realidade? Restam muitas perguntas sem resposta-pronta, e para resolver ou dissolver estes problemas é preciso lançar-se sobre este caminho, de prática e busca da justiça, que mistura uma série de elementos. Está claro que não é apenas um tipo de ação que dará conta dos problemas à nossa volta. A missão é integral, e deve ser pensada e realizada deste modo. Fica para nós o princípio vivo do Evangelho de Jesus que pede que dirijamos nossa atenção para a Natureza e os oprimidos da Terra. O cuidado é o novo-velho paradigma do cristianismo. Por isso afirmamos que justiça social também é vida devocional.
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Nota:
[1] Espiritualidade exercida a partir da leitura e da vivência dos Evangelhos.
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*Escrevi este texto com a intenção de mostrar em que direção aponta a minha visão sobre Justiça. (O texto foi revisado por Marcos Vichi)