Um convite ao diálogo: discriminação racial e cotas na universidade
Pedro Grabois
“Aprendei a fazer o bem! Buscai o direito, corrigi o opressor! Fazei justiça ao órfão, defendei a causa da viúva! Então, sim, poderemos discutir, diz o Senhor” ( Isaías 1:17-18a)
Eu costumava interpretar esse versículo de maneira muito pragmática, a ação vinha sempre antes da discussão. Como ficava então o meu anseio por discutir, pensar, refletir, arrazoar?
Cedi àquela vontade e fui cursar Filosofia, para alguns um curso muito teórico e pouco prático. Minha crise se resolveu quando entendi que teoria e prática, pensamento e ação já não caminham separados. O trabalho que eu posso desenvolver, como “filósofo”, como pesquisador, como diagnosticador do presente tem um papel fundamental para as ações que nós cristãos podemos empreender para transformar realidades à luz do Reino de Deus.
Descobri, na Filosofia, um caminho não muito óbvio de contribuição para a Missão na qual todos tomamos parte. Não muito óbvio porque muitas vezes o rigor conceitual (um “preciosismo”) da Filosofia não me deixa trabalhar diretamente com “dados empíricos”. Na pesquisa que desenvolvo, estudo as relações entre ética, formas de conduzir a vida e formas de resistir a diferentes “opressões” (para simplificar). Não estudo ali diretamente o fenômeno da religião e da espiritualidade, mas eu o vivencio a cada dia.
Caminhando com a ABU na universidade, aprendi a diagnosticar também o tempo presente e os vários problemas e injustiças que o perpassam. Na ABU e a partir dela, descobri um universo social muito plural, descobri o quanto são diversos os “atores sociais” (dentre os jovens e os já não tão jovens) que mobilizam mudanças importantíssimas para a atualidade. Falar e agir com – vou usar um conceito antigo – responsabilidade social não é fácil. Pensar então no nosso papel político enquanto juventude evangélica na universidade brasileira é mais complexo ainda. Os temas são muito espinhosos, há muitas opiniões, muitas discordâncias, algumas convergências.
Um assunto nada fácil do qual tenho me aproximado bastante é o problema do racismo. Aqui coloco minha opinião e minha posição sobre o tema, isto é, sempre é possível discordar do que vou dizer, mas não digo nada aqui sem embasamento. Embora a dialética já não seja mais paradigma na Filosofia, quero, dialeticamente, junto com o texto de Isaías, agir e refletir, refletir e agir. E é pensando este tema que eu gostaria de encerrar este texto.
A discriminação racial continua sendo uma realidade hoje no Brasil. É muito difícil verificar o preconceito racial em atitudes individuais porque isso é sempre muito velado, disfarçado; é tudo muito sutil e cordial. É preciso combater esse tipo de atitude, obviamente, mas não é somente contra esse racismo que precisamos lutar. É preciso combater o racismo estrutural, uma forma de discriminação por raça que se estabelece nas estruturas de organização da sociedade e em instituições como hospitais, escolas, empresas, universidades, bancos, etc. A população negra continua tendo menor acesso à saúde e à educação, e continua sendo maior alvo da violência nas comunidades populares e periferias do Brasil. Se olharmos e interpretarmos os dados da desigualdade social do país, perceberemos que mesmo entres os mais pobres, há desigualdade entre brancos e negros. Os negros continuam tendo piores condições de vida. Uma política universal para potencializar a vida das populações em geral não iria dar conta desse problema. É preciso agir também pensando a partir dessa especificidade da população negra. Promover políticas de ação afirmativa para as pessoas negras é uma forma de reparar os aspectos discriminatórios que as impedem de ter acesso às mais diversas oportunidades. No caso da mulher, por exemplo, vem-se criando as delegacias policiais especializadas na questão de gênero. No caso da juventude negra, vem-se discutindo o polêmico tema da política de cotas.
Como não posso me alongar aqui, também não vou completar toda a minha argumentação sobre o tema, a Filosofia me pede uma paciência maior! Mas é também a Filosofia e ainda a fé nesse Deus que transforma situações concretas de injustiças que me ensinam a estar atento ao presente, a diagnosticar e agir sobre essa atualidade, sabendo que Deus apresentou os princípios para nossa ação em Jesus, a Palavra encarnada. Assim, nós, Aliança ao mesmo tempo Bíblica e Universitária, veremos como sendo tarefa nossa discutir, com humildade, respeito e indignação, estas difíceis questões: o acesso e a permanência de jovens nas universidades brasileiras. E veremos como agenda: combater o pecado do racismo, a partir do nosso arrependimento.
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